terça-feira, 4 de novembro de 2008

O quê é Eficácia? parte 2

Na primeira parte procurei explicar os têrmos eficiência, eficácia e efetividade. Agora que vocês sabem como eu estarei usando estes têrmos passarei a discussão eficácia em artes marciais propriamente dita.

A primeira coisa a ser estabelecida é: qual o objetivo principal de minha prática marcial?

Caso o objetivo seja melhoria da minha qualidade de vida(já que "saúde" é meio vago), como a minha prática se propõe a alcançar esta meta?

Qualidade de vida engloba: eficiência fisiológica(o corpo funcionar de forma eficiente), eficiência psico-emocional(a mente lidar com as experiências de modo equilibrado, sem desgastes) e eficiência social(interação social harmoniosa).

Uma modalidade que provoque machucados crônicos não será fisiologicamente eficiente. Uma que intensifique a agressividade não será social ou psico-emocionalmente eficiente. Observando sob este prisma muitas modalidades são na realidade bem pouco saudáveis...

Caso o objetivo seja a capacidade de derrotar outras pessoas em duelos corpo-a-corpo (já que defesa pessoal é fuga e combate se fundamenta em armas), como minha modalidade se propõe a alcançar esta meta?

Num duelo corpo-a-corpo a meta é comparar habilidades de modo  valorar um vencedor. Regras são definidas. Elas podem ser específicas (como no Kendo, onde até mesmo a forma de andar é restrita) ou vagas("apenas dois lutadores" ou "lutar até knockout ou desistência"), mas estarão presentes.

Derrotar pessoas em duelo corpo-a-corpo engloba: conteúdo conciso(menos informação gera menos necessidade de decisões conscientes e maior intensidade de treinamento) , ênfase em treino livre com variação de parceiros(para estimular a criatividade intuitiva) e condicionamento desportivo(trabalho paralelo voltado para a aquisição de mais força, velocidade ou resistência, de acordo com as necessidades da modalidade de duelo).

Uma modalidade com um conteúdo muito prolixo ("nosso estilo tem mais de dez mil formas de coçar o nariz...") será combativamente ineficiente. Uma que se concentre na prática de exercícios formais(Kata ou Xing) não terá uma prática eficiente para o caos do combate. Uma que ignore a necessidade de trabalho paralelo de fortalecimento estará ignorando uma parte significativa da formação de um lutador.

Da próxima vez que você for treinar se pergunte: o quê estou pretendendo obter de meu treinamento e quão adequado a este objetivo ele parece ser? 

Continua...

Reflexões sobre a prática e ensino de artes marciais.

Uma discussão que frequentemente vêm à baila é sobre "métodos ultrapassados" ou sobre como "mestre X aperfeiçoou as técnicas tradicionais".

É interessante como as pessoas parecem achar que MÉTODOS são coisas de materialidade tangível. É como se as técnicas do Karate Shotokan(exemplo) estivessem lá, guardadas numa pokebola*,e o praticante as recebesse; na hora do combate bastaria gritar "Oizuki, eu escolho você! Ruma a desgraça de pégasu!".

Na prática, este erro é compreensível.

Nossa geração viveu uma quebra de paradigma nas artes marciais. Sua comercialização.

Numa época onde elas eram empregadas em seu papel original(prover guerreiros de habilidades facilmente empregadas em combate) seu conteúdo era simples e objetivo. Tão logo o básico fosse dominado o guerreiro era enviado para batalhas, nas quais teria a chance de pôr a prova o quê lhe foi ensinado e, em alguns casos, complementar este conteúdo com suas próprias experiências.

Com o advento da paz estas modalidades foram se modificando. Seu objetivo primário não sendo mais tão imediato(nenhuma guerra às vista), novos papéis foram encontrados. Ginástica, prática social, válvula de escape da agressividade dos jovens, máquina ideológica do estado...e de acordo com estas novas roupagens, novas organizações de currículo e metodologias foram experimentadas.

Estes fatos eram e são ignorados pela maioria dos praticantes e boa parte dos "mestres". Modalidades fundamentalmente civis e ginásticas são ensinadas como "herança dos antigos guerreiros do/a [escolha seu país]". Nos casos em quê o "mestre" percebe que as técnicas "tradicionais"(que às vezes vêm de uma "tradição" de menos de dez anos) não funcionam bem, este faz uso de seus [superficiais] conhecimentos sobre combate[competições e filmes] para "aperfeiçoá-las", com resultados questionáveis.

Infelizmente muitas das modalidades mais populares atualmente foram fruto de processos similares. As modalidades mais difundidas atualmente(Judo, Karate, Taekwondo, Taichichuan, Hapkido, Aikido, Wing Chun e Jiujitsu) são criações recentes, desenvolvidas por esportistas ou brigadores de rua. E sofreram processo de "refinamento" voltado para duelos esportivos("desafios" onde habilidades são colocadas em oposição).

Isso somado à cultura popular e ao folclore oriental criou vários mitos hoje defendidos como verdades.

A menos que estejamos dispostos a admitir nosso apêgo à fantasia será impossível têrmos a objetividade necessária para levar nossas modalidades à seu potencial pleno.

*Poke-bolas são dispositivos usados o desenho animado japonês(anime) "Pokêmon"(do japonês poketoo monsuta ou monstro de bolso)

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Salvador, Bahia, Brazil
Um shodanzinho autodidata que acabou virando um polivalente polidanzinho autodidata.